a tela e o novo

Monday, November 23, 2009
Posted by UD

o barulho hoje em dia é insuportável.

chega a ser um forte insulto.
definitivamente não se tem a mesma paz de outrora.
no meu tempo tudo o que se ouvia era o murmurar do projetor.
talvez um ocasional suspiro de alguma garota na primeira fileira, incapaz de segurar a emoção ao ver a clara imagem do amor na sua frente, em 12 metros de altura por 20 de largura.
mas nada que prejudicasse a experiência.
há quem me chame de saudosista, mas lhes digo que definitivamente ir ao cinema já não é a mesma coisa.
além da ostensiva quantidade de lixo captada em celulóide ali exibida, hoje a tela tem que competir com as guloseimas, com os aparelhos de telefone móveis, rádios, conversas, gritos e falta de cortesia em geral.
trabalhei por 17 anos como lanterninha e as vezes tenho de me segurar pra não puxar algum desses moleques mais falantes que um carrapato pelas orelhas e lhe fechar a boca com um ferro de solda.
não é que eu seja uma pessoa ranzinza, mas algumas pessoas deveriam ser terminantemente proibidas de entrarem em um cinema.
deveria ser feito um teste, onde simples questões seriam avaliadas, como estado mental, habilidade de se manter em silêncio, nível de auto-estima e capacidade de atenção.
os que não passassem, seriam terminantemente proibidos de sentarem as nádegas em uma cadeira pública diante de uma tela.
em uma instância mais justa, talvez poderiam ser depostos para uma ilha secreta, nos arredores de marajó, onde poderiam comer ostras e fornicar com crianças e parentes livremente na areia, sem se preocuparem em coexistirem com nós, o resto racional.
talvez lá o governo criasse um cinema especial para os inadequados, onde se pudesse falar e se exibir a vontade, bem como degustar dos mais variados e barulhentos petiscos, por um preço mais barato, eles poderiam se divertir, com as imagens na tela servindo apenas como pano de fundo para suas leviandades.
não sei por que ainda insisto em ir a este que se tornou um grande templo dos desprazeres, talvez seja falta do que fazer.
na minha idade se faz as coisas nem que seja para se ter do que reclamar depois.
mas fato é que, com ou sem os absurdos que o destroem, esse lugar de acentos macios está de certa forma conectado a minha pessoa.
o carrego quase como um anexo orgânico a minha já cansada carcaça a cada passo sobre o veludo aconchegante de seus tapetes.
e sei que ele me perdoa, quando em meio a meus sonhos perversos, ao ouvir as regulares ofensas hoje ali disparadas, imagino-me banhando-o em querosene, da tela aos rostos pequenos, e acendendo um cigarro que logo partilho com os brutos, enquanto sentado tranqüilo, assisto a tudo que queima, vendo na tela, que talvez refletisse as silhuetas dos imbecis em fuga desesperada, a paz, em 12X20.
ao pensar nisso imediatamente sorrio, e o filme está para começar.


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